quinta-feira, 30 de outubro de 2008

O que você me trouxe?

“Olá, menininha! O que escondes aí, atrás das costas? Uma flor?”


E ela sorria. Doce, meiga e fofinha de querer apertar as bochechas! Os olhinhos, azuis como o céu da manhã com cheiro de canela, eram tão sinceros que ninguém poderia crer em maldade alguma vindo desse pequeno anjo.


“Que guardas?” E inclinou a cabeça para a direita, num ímpeto de curiosidade.


A menina continuava com os dois bracinhos rechonchudos para trás, segurando algo. Queria fazer uma surpresa! Sabe como são as crianças... sempre aprontando alguma diversão!


“Com esse sorriso, eu diria que é uma generosa porção de comida. Mas também pode ser uma foto que queira me mostrar. Vamos! Revele!” Ele começou a pensar, tornando-se agradavelmente impaciente.


A bonequinha viva dançou em um só pé; ameaçou um giro... mas, continuou parada, revelando nada mais que uma expressão adorável. Que bochechas gorduchas! Que risadinhas gostosas!


“Opa! É agora!” E deu um pulinho à frente, quase subindo em cima da menina.


Ela esticou um braço, enquanto o outro continuava guardando o segredo sob sete chaves, ou cinco dedos. Levou o dedinho ao nariz do amigo, brincalhona. Riu mais um pouco enquanto se inclinava. Desequilibrou-se por um segundo e riu ainda mais, agora de si mesma. Era deliciosamente desastrada, como uma boneca de pano que não pára em pé.


“Ei, agora chega, vamos? Mostre-me o que tens!” E passou a inquietar-se.


O sorriso afinou no rostinho redondo da personificação de bondade que era a menininha. Era agora. A curiosidade do amigo finalmente seria extingüida. Enquanto uma mãozinha procurava apoio na parede ao lado, o outro braço começou a se mover lentamente... O rosto se aproximava, carregando seu sorrisinho. Até que, enquanto o pequeno esbugalhava os olhos, pronto para o surpreendente grand finale, o braço da bonequinha de pano moveu-se rápido o bastante para o passarinho não ver mais nada, muito menos voar em retirada. Numa só estocada, lá se foi a curiosidade, a vitalidade e todo o resto do bichinho. Ficou só carne, pena, queratina e ossos. Ah, sem nos esquecermos do sangue escorrendo. E o sorrisinho do anjinho que guardava alguma boa surpresa a ele...




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foto por Amanda

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Cannonball

there’s still a little bit of your taste in my mouth
there’s still a little bit of you laced with my doubt
it’s still a little hard to say what's going on

there’s still a little bit of your ghost your witness
there’s still a little bit of your face i haven't kissed
you step a little closer each day
that I can't say what's going on

stones taught me to fly
love, it taught me to lie
life, it taught me to die
so it's not hard to fall
when you float like a cannonball

there’s still a little bit of your song in my ear
there’s still a little bit of your words i long to hear
you step a little closer to me
so close that I can´t see what´s going on

[...]
so come on courage, teach me to be shy
'cos its not hard to fall,

and I don't want to scare her
it's not hard to fall
and i don't want to lose
it's not hard to grow
when you know that you just don't know.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Quando só se ouve o silêncio...


Senta aí. Hoje eu não quero saber o que ocorreu na China ou se a bolsa despencou. Danem-se todos os outros problemas do mundo. Eu quero ver a sua ferida. Eu quero sentir na pele o anzol que te fisgou, o sangue que jorrou daí. Tira essa blusa. Não quero nada entre nós dois, atrapalhando nossa sintonia. Permita o meu toque, as minhas mãos caçando cada falha na tua epiderme. Arrepia até a alma, que eu quero fazer-te sentir também.

Essas cicatrizes e feridas mal curadas por debaixo de toda essa gaze não me enganam. Deixa-me vê-las, tocá-las. Quem sabe melhorá-las...? É isso que te faz fraco, sereno, humano. É isso que te faz homem. Meu homem. Ao menos por essa noite... Aqui e agora, nessa sala fria, iluminada por um azul pouco celeste.

Pode despir-se. Não me engana mais com toda essa folhagem escondendo seu cerne. Eu pude ver num clarão, por uma fração de segundo, seu peito brilhar. Eu sei de uma fagulha, uma centelha aí dentro. É uma faísca esperando por uma ignição completa. Deixa-me acender o fósforo. Eu quero ver essa carne velha queimar e me incendiar com você. Das cinzas renasce a fênix. 

Hoje à noite, nada mais me importa. Se eu puder aliviar um décimo do que te dói, eu estarei inteiramente em paz comigo mesma.

Conta-me. Abre-te comigo. 

Eu não quero machucar-te... só quero sentir-te.